Julia Pombo

De wiki da nuvem
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flores movem suas cabeças contra a janela

permanecer imóvel, em pé, durante o máximo de tempo que conseguir, durante os dias de residência, variando o lugar inicial em cada dia. d-entro disso, os intervalos permitidos serão os momentos de refeição, para usar o banheiro, dormir e ajudar nas tarefas do cotidiano (como lavar louça, etc). a pesquisa com a imobilidade também implicará em permanecer sem silêncio (a voz como parte do corpo imóvel).

neste processo, em caso de ‘falha’ (mover em momentos não “permitidos”), outra regra integrará a pesquisa: o deslocamento, através de estudos de movimentos de repetição/improvisação, para reiniciar a imobilidade em outro lugar.

a proposta de investigar a imobilidade parte de processos criativos desenvolvidos com o corpo em suas possibilidades de mover, fragmentar, relacionar, e estar em limite, abrindo novos processos de subjetivação.

a imobilidade faz parte do mover, ela nunca é absoluta. o corpo passa por diversos e intensos processos de movimento, mesmo quando está visivelmente parado. a proposta busca um diálogo entre o invisível móvel e o visível imóvel – quais as distâncias e proximidades existentes entre esses dois estados? como uma coisa afeta a outra?

abrir a percepção para a imobilidade amplia as possibilidades de movimento.

aliados a esta pesquisa com/no corpo, estão a imagem (especialmente fotografia e vídeo) e a roupa (a costura). processos de criação em torno dessas questões vem sendo desenvolvidos, e todas essas coisas se relacionam e intercessionam. em flores movem suas cabeças contra a janela, a pesquisa com a indumentária entra nesse diálogo com a imobilidade.

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1.

a imobilidade corporal, promovida por mecanismos neurais ativos que suspendem a emissão de atividade motora dos músculos esqueléticos, é uma manifestação comportamental compartilhada por inúmeras espécies animais. assim, é possível observá-la durante o sono da maioria das espécies, nos filhotes de mamíferos quando suspensos pela pele dorsal do pescoço pelas mães que os transportam nos dentes, em predadores durante a espreita para emboscar uma presa, em vários animais em situações de alerta ou medo, em animais que mimetizam elementos inanimados do ambiente e em outras situações mais específicas, tal como nas fêmeas de muitas espécies durante a cópula. a ampla variedade de situações, a vasta gama topográfica das posturas de imobilidade e o número de espécies em que ela ocorre levaram a cunhar o termo respostas de imobilidade para designá-las em conjunto.

estas imobilidades têm funções adaptativas diferentes.

discute-se se existe uma resposta de imobilidade fundamental com expressões diferentes, induzida por uma série de estímulos diferentes e segundo a espécie considerada, ou se existem diferentes formas de imobilidade com diferentes características em cada espécie e diferentes formas de imobilidade coexistam em uma mesma espécie.

a imobilidade pertence à categoria de comportamentos de defesa, precedida inicialmente por emissão de comportamentos de enfrentamento e são respostas evocadas por uma situação de estresse.

a imobilidade se instala após período inicial de emissão intensa de tentativas de evasão da situação estressante e aversiva.

a inescapabilidade nestas situações é uma possibilidade e a emissão de imobilidade, após um período de enfrentamento ativo, pode ter a função de conservação de energia para gasto em condições mais favoráveis, ou ser manifestação de um estado depressivo que evoluiu filogeneticamente para tornar indiferente o sofrimento da morte em condições adversas extremas


Imobilidade animal.jpg

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2.

a origem da indumentária é alheia às variações de temperatura e está ligada ao movimento e à luta entre os sexos.

alguns trajes se destinavam a esconder o corpo pela rigidez e imobilidade.

a mulher era inicialmente paralisada da cintura para baixo. o uso da saia apertada é uma sobrevivência dessas amarras antigas que visariam impedir a locomoção, fixando-a.

o uso das calças obedece às necessidades, sempre crescentes, de proteger as pontas do corpo responsáveis pelo movimento.

o feminismo se desenvolve com a conquista, pela mulher, dos movimentos da parte inferiror do corpo, isto é, com o movimento das amarras que impedem esses movimentos.

é pelo movimento em defesa do corpo que a idumentária se altera e é com o advento da confirmação do simbolismo místico no traje religioso no século ix que as classes hierárquicas na igreja começam a distinguir-se pelo traje - quanto mais alta a classe hierárquica, maior o número de peças no traje. isto significa: quanto mais alta a classe hierarquica, mais isolado se torna o corpo do mundo exterior.

o isolamento máximo traz a imobilidade máxima à mais alta hierarquia. imobilidade e altura hierárquica se confundem. paradoxalmente, a proteção ao movimetno conduz à ausência de movimento.

durante mais de cinquenta anos, um dos recursos do tratamento psiquiátrico era utilizar uma camisa de lona resistente, com as mangas muito compridas e fechadas que eram amarradas firmemente, com cordões. os braços e a parte superior do corpo ficavam amarrados às costas, impedindo movimentos violentos e deixando a pessoa imobilizada e inofensiva.

despojado de suas roupas e vestido com as imensas vestimentas da instituição. as largas roupas o impedem de perceber as condições do próprio corpo. o espaço ocupado é sempre o mesmo - imóvel, caminha em círculos.

as correntes imobilizantes do escravo, do prisioneiro e do rei, são aplicadas nas pontas do corpo: a cabeça, os pés e as mãos. a tortura é quase sempre aplicada nas pontas do corpo e são essas pontas que recebem hoje o adorno das jóias.

é o movimento que provoca as grandes alterações na moda e na maneira do ser humano se apresentar ao mundo. o movimento deu à humanidade linguagem e visão geográfica.

3.

sempre houve o desejo de impedir a liberdade de pensamento que se encontra ligada à liberdade de locomoção.

o ser humano do começo bailava e chorava, executando a sua linguagem abstrata de gestos com os pés e as mãos e assim fazia para atrair a atenção do seu semelhante, comunicando-se com este.

o movimento reflexo, proveniente do equilíbrio da árvore, quando eliminada a árvore, continuou segurando galhos abstratos e ausentes em estranha e bela gesticulação, acompanhados de sons monotonais.

da mesma maneira que o canto está antes do som articulado também a dança é gerada antes do movimento articulado metronomizado e esteriotipado da vida diária.


Camisa de força.png Imobilidade ou emissao.jpg


(os textos 1, 2 e 3 são compostos por trechos de um artigo científico encontrado na internet e por trechos dos escritos de flavio de carvalho)

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registros:


do olhar (não olhar) e do engolir.

olhar o mesmo ponto sempre

olhar com dispersão

na imobilidade ter a escolha.

outras possibilidades da experiência do olhar.

sair e voltar. volta.

espasmos. quebras.

o ouvido nunca fica imóvel. a voz muda é corpo não físico imóvel. a escuta nunca fica imóvel.

o que é o tempo?

o que é o frio?

os únicos movimentos "controlados" / "intencionais" das plantas são o crescimento e os devios em busca da luz


sol, verde, ar.

os insetos fazem de mim planta, pedra, coisa.

música, provocação. concentração.

que imagens permanecem de uma ação?

a roupa que limita potencializa.

voz silenciada - imobilidade permanente.

interrompida pelo fluxo do ciclo, pela dor das entranhas.

descanse e volte.


o corpo dentro e o corpo fora. interferências.

a memória do registro.

o pensamento nunca imobiliza.

olhar o mesmo ponto sempre ou olhar o mesmo movimento sempre. fixo - mutável.

silenciar a fala para conservação de energia.

chuva - choro.

a loucura e o altismo.

chuva - choro. força e entrega.


o branco e o silêncio.

pele.

ruído.

isolamento e contato.

o máximo de tempo não é o suficiente.

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o encontro: manuel de barros - o retrato do artista enquanto coisa